sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Ensaio sobre a cegueira


Uma epidemia de cegueira espalha-se vertiginosamente sobre uma cidade, a visão das pessoas é tomada por uma névoa branca, de um instante para o outro. Qualquer pessoa que tem contato com os infectados passa a ter o mesmo destino e são enviados ao isolamento de um hospital psiquiátrico abandonado.
O filme de Fernando Meirelles é uma história instigante, que divide opiniões, inspirada no livro de José Saramago, nos remete a uma dúvida, será que conhecemos da essência do outro e mesmo a nossa própria? E expõe a fragilidade da humanidade diante do caos, que aflora no homem os instintos ocultos que até então nunca imaginaríamos que pudesse existir, como animais no seu egoísmo cego, na luta pela sobrevivência.
Em meio aos infectados pela cegueira branca, uma mulher (Julianne Moore), a única testemunha ocular, por amor ao seu marido finge estar cega para ficar ao seu lado. Imune ao “vírus”, ela se vê diante de uma situação de horror, pessoas se deflagrando em sentimentos de ódio, egoísmo e oportunismo, desencadeados principalmente, por terem que se adaptar tão abruptamente a uma “escuridão” branca, e as falhas do Estado arrancam desses deficientes suas necessidades mais básicas.
Depois de várias semanas de terríveis conflitos, esta mulher, junto com um pequeno grupo, se liberta do confinamento e o que encontram é uma sociedade desmoronada, cenas que isentam todos os vestígios civilizatórios de uma nação: o lixo, a desordem, corpos sendo devorados por cães e pessoas sujas vagando em busca de água e comida. Este grupo, tenta reencontrar a humanidade perdida, e Julianne é a única que tem a imagem diante de seus olhos, de uma população vencida aos seus instintos mais primitivos.
Estas cenas mostram, a depreciação de uma civilização que diante de tal fato, exime-se de todos os padrões impostos pela sociedade capitalista, num registro da busca pela sobrevivência física de multidões cegas, neste mundo não existem mais: ricos e pobres, brancos e negros, feios e bonitos, intelectuais e analfabetos. Uma época em que todas estas classificações perdem o seu valor, e a mundo entre em colapso, numa terra sem regras e leis, o que prevalece é o instinto animal de uma humanidade reduzida a larvas.
Entre o grupo conduzido por Julianne, às emoções estão à flor da pele, que se subverte em irracionalidade e sentimentos de amor e compaixão, é o que acontece com essas pessoas que se conheceram nas profundezas de um brilho branco, sem mesmo nunca terem se visto, apenas em contato tátil e auditivo, depois conseguem obter uma vida digna de necessidades básicas por estarem protegidos pela visão de Moore.
Meirelles nesta obra lança uma linguagem simples, lapidada com modernidade, que mostra a frágil organização social, com imagens ricas em detalhes que falam mais que mil palavras.
Por
André Andrade

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